terça-feira, 3 de agosto de 2010

Por uma educacao ambiental emancipatória

Autor: José Silva Quintas

Freqüentemente, educadores de órgãos ambientais e das chamadas organizações não-governamentais são procurados por grupos sociais, orgãos públicos, empresas, movimentos sociais, escolas e entidades comunitárias para formularem,orientarem ou desenvolverem programas de EducaçãoAmbiental a partir de várias temáticas. São trabalhos relacionados com lixo, recursos hídricos, desmatamento,queimadas, agrotóxicos, irrigação, manejo florestal comunitário,espécies ameaçadas de extinção, ecoturismo, unidades deconservação, e tantos outros temas, que em muitos casos estão,também, associadas com questões étnicas, religiosas, políticas,geracionais, de gênero, de exclusão social etc. Além da variedade de temas, é comum também se encontrar uma grande variedade de abordagens.

O modo como um determinado tema é abordado em um projetode Educação Ambiental define tanto a concepção pedagógica quanto o entendimento sobre a questão ambiental que estão sendo assumidos na proposta.

A questão do lixo, por exemplo, pode ser trabalhada em programas de Educação Ambiental desde a perspectiva do “Lixo que não é lixo”, onde o eixo central de abordagem está na contestação do consumismo e do desperdício, com ênfase na ação individual por meio dos três R (reduzir, reutilizar e reciclar),até aquela que toma esta problemática como conseqüência de um determinado tipo de relação sociedade-natureza, histórica esocialmente construída, analisa desde as causas da sua existência até a destinação final do resíduo e, ainda, busca a construção coletiva de modos de compreendê-la e superá-la.

Para quem se identifica com a primeira perspectiva, está implícita a idéia de que a prevenção e a solução dos problema ambientais dependeriam, basicamemte, de “cada um fazer sua parte”. Assim, se cada pessoa passasse a consumir apenas o necessário(aquelas que podem), a reaproveitar ao máximo os produtos utilizados e a transformar os rejeitos em coisas úteis, em princípio,estar-se-ia economizando recursos naturais e energia e, destaforma, minimizando a ocorrência de impactos ambientaisnegativos.

Neste quadro, à Educação Ambiental caberia, principalmente, promover a mudança de comportamento do sujeito em sua relação cotidiana e individualizada com meio ambiente e comos recursos naturais, objetivando a formação de hábitos ambientalmente responsáveis no meio social. Esta abordagem evidencia uma leitura acrítica e ingênua sobre problemática ambiental e aponta para uma prática pedagógica prescritiva e reprodutiva. Assim, a transformação da sociedade seria o resultado da transformação individual dos seus integrantes. Na outra perspectiva, assume-se que o fato de “cada um fazer sua parte”, por si só não garante, necessariamente, a prevenção e solução dos problemas ambientais.

Numa sociedade massificada e complexa, assumir no dia-a-dia condutas coerentes com as práticas de proteção ambiental pode estar além das possibilidades da grande maioria das pessoas. Muitas vezes o indivíduo é obrigado, por circunstâncias que estão fora do seu controle, a consumir produtos que usam embalagens descartáveis em lugar dos retornáveis, alimentar-se com frutas e verduras cultivadas com agrotóxicos, utilizar o transporte individual em vez do coletivo, trabalhar em indústria poluentes,aceitar a existência de lixões no seu bairro, desenvolver atividades com alto custo energético, morar ao lado de indústrias poluentes, adquirir bens com obsolência programada, ou seja,a conviver ou praticar atos que repudia pessoalmente, cujas razões, na maioria dos casos, ignora. De acordo com esta visão, as decisões envolvendo aspectos econômicos, políticos, sociais e culturais são as que condicionam a existência ou inexistênciade agressões ao meio ambiente.

Nesta concepção, o esforço da Educação Ambiental deveria ser direcionado para a compreensão e busca de superação das causas estruturais dos problemas ambientais por meio da ação coletiva e organizada. Segundo esta percepção, a leitura da problemática ambiental se realiza sob a ótica da complexidade do meio social e o processo educativo deve pautar-se por uma postura dialógica, problematizadora e comprometida com transformações estruturais da sociedade, de cunho emancipatório. Aqui acredita-se que, ao participar do processo coletivo de transformação da sociedade, a pessoa, também, estará se transformando.

QUINTAS, José Silva. Por uma educação ambientalemancipatória. Senac e Educação Ambiental, Rio deJaneiro, v. 10, n. 1, p. 49, jan./abr. 2001.

Foto: Vista do Centro de Caraguatatuba (SP) / Ericka Liz

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